Problemas e falhas relacionados à dispensação eletrônica
Com o crescimento das prescrições eletrônicas, surgiram dúvidas sobre a dispensação eletrônica de medicamentos controlados. Entenda porque hoje nenhum sistema possui um mecanismo que feche o ciclo da dispensação.
O termo dispensação de medicamentos é comum na área farmacêutica, mas, ganhou novas nuances com a ascensão das prescrições eletrônicas. O objetivo da dispensação é o Uso Racional de Medicamentos, conhecido como URM, tendo como foco principal a saúde do paciente. Neste sentido, é fundamental entender alguns conceitos que envolvem as diretrizes dos Conselhos Federal e Regionais de Farmácia, as leis federais e o funcionamento dos meios digitais.
O princípio que rege a prescrição eletrônica é o atendimento à distância, o que foi impulsionado desde o início da pandemia. Para viabilizar a tecnologia, instituiu-se o seguinte fluxo:
A análise realizada no site https://assinaturadigital.iti.
O Registro da Dispensação garante que não houve dupla dispensação de medicamentos controlados?
Não. É uma exigência legal que todas as farmácias e drogarias estejam registradas no Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC) e tenham acesso periódico ao sistema da ANVISA, onde são realizados os registros de entrada e saída de novos medicamentos. Estes sistemas controlam o estoque do estabelecimento e, consequentemente, estimulam o URM.
O grande problema, porém, é que os sistemas atuais não se comunicam com nenhum prescritor que possa cruzar as informações da prescrição com o estoque das farmácias e, desta forma, garantir que realmente o medicamento não seja dispensado mais de uma vez.
Outro ponto que difere a prescrição eletrônica é que ela não é passível de retenção, uma vez que podem ser feitas inúmeras cópias do documento. Por isso, a assinatura digital deve ser validada em todas elas.
O que se pode dizer é que o fluxo existente no Brasil hoje é frágil no que tange a evitar a dupla dispensação e não existe qualquer sistema que realmente feche este ciclo, ou seja, atualmente ainda não é possível garantir que não haja dupla dispensação de medicamentos controlados, e ainda que se tente implementar uma solução no âmbito privado, não haverá obrigatoriedade e, consequentemente, a informação nunca será confiável.
Qual seria um caminho viável para evitar a dupla dispensação de forma completa?
A viabilidade de se ter um sistema seguro que receba e cruze todas as informações das prescrições e estoque, alimentadas pelos farmacêuticos de múltiplas drogarias e farmácias, está diretamente ligada a um papel de centralizador de informações, que hoje ainda não existe. A única forma de garantir que um sistema centralizador como este seja alimentado de maneira confiável é por força de lei, o que só pode ser exercido pelo órgão público, como agente regulador e isento de interesses de negócio. Qualquer outro caminho não garantiria a confiabilidade destes dados.
Além de resolver o problema da dupla dispensação, este modelo endereça ainda questões relacionadas à privacidade.
Como um sistema como este poderia endereçar questões de segurança da informação?
A dispensação é um ato técnico, por isso a escolha do medicamento não pode, em nenhuma hipótese, estar associada a qualquer tipo de interesse ou vantagem financeira. Nenhum dos envolvidos no fluxo da prescrição deve agir em benefício próprio ou visando interesses financeiros. O farmacêutico, no exercício da profissão, não pode estar sujeito a nenhuma pressão para cumprir metas de vendas de medicamentos, já que isso vai contra o que prevê os Conselhos Federais e Regionais de Farmácia e estaria ferindo a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
O registro de dispensação em um sistema privado fere o princípio básico da LGPD, já que o sistema deixa visível a terceiros, sem o consentimento do paciente, qual medicamento ele comprou, em qual drogaria e até a data da compra, informações que deveriam ser privadas e de conhecimento apenas do paciente e do farmacêutico, como já prevê o Conselho Federal de Farmácia.
A LGPD visa minimizar ao máximo a coleta de dados dos pacientes e o desvio de finalidade, evitando que as informações se tornem um negócio rentável às empresas e pouco benéfico para os indivíduos, podendo inclusive gerar sérias violações de privacidade. Com um sistema público, essa variável seria eliminada, já que ele atuaria como agente centralizador e regulador, e não capitalizador.
Seja um sistema inteiramente novo ou mesmo ligado ao já existente SNGPC, o registro e cruzamento dessas informações em um sistema centralizador federal, por força de lei, é o caminho mais lógico para evitar a dupla dispensação de maneira realmente eficaz, aumentando ainda a segurança dos dados das pessoas.
Na era digital, o farmacêutico precisa estar ciente de fatores que antes não eram parte da sua realidade, mas que hoje são cruciais para o exercício de sua profissão. Neste sentido, o profissional deve garantir o cumprimento da lei e as diretrizes do Conselho Federal de Farmácia, que prevêem que o fluxo de validação oficial seja feito apenas via ITI. Qualquer outra opção diferente desta, ou seja, não oficial, pode ter como objetivo o uso dos dados das pessoas para outras finalidades, o que vai contra a lei e os princípios éticos. Por isso, qualquer decisão na era da informação deve ser, mais do que nunca, consciente e segura. Não corra riscos!
Autor: Jomar Nascimento, CEO e Cofundador da ProDoctor Software S/A
https://prescricaoeletronica.cfm.org.br/
https://www.cff.org.br/noticia.php?id=5674
http://www.crfsp.org.br/documentos/materiaistecnicos/ManualOrientacao-PrescricaoFarmaceutica.pdf
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